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Plas Ayiti (projeto neon)

Plas Ayiti (projeto Neon) de Milla Jung, realizado em 2014, é uma intervenção artística na praça central da cidade de Curitiba, Praça Tiradentes, no sul do Brasil. Composta de uma instalação luminosa em neon de 4,5 X 1,00 metro, no topo do edifício Nossa senhora da Luz, figurava ao cair da noite o termo Plas Ayiti, que em créole—a língua dos haitianos—significa “lugar haitiano”, dando a ver o nome como esses imigrantes refugiados se referiam à praça, da qual faziam seu ponto de encontro comunitário.
A intenção desta intervenção em neon—que é um tipo de iluminação quase inexistente no Brasil sulino—foi a de convocar certo estrangeirismo, aproximar este ponto periférico do mapa do Brasil de outras Américas, ampliando, desse modo, a experiência relacional do que seria idealmente uma urbe contemporânea, um espaço político aberto ao diálogo e à diferença. Para Rosalyn Deutsche1, um espaço político de apresentação pública está condicionado a ser realmente público somente na medida em que se oferece como um espaço de alteridade, onde é possível aparecer para um outro e responder a sua aparição. Nessa habilidade de resposta—“respons(h)ability”—é que entraria em jogo um espaço para a diferença, ou seja, uma construção de um espaço democrático.

Em sua operacionalidade Plas Ayiti pretendia realizar-se como uma aparição tanto literalmente como conceitualmente, onde os haitianos refugiados podiam reconhecer-se num código comunitário, antes privado, mas agora inserido na esfera pública local, ao mesmo tempo em que os citadinos podiam não reconhecer-se de imediato na legibilidade contextual da obra. Um giro que primeiro pretendia deslocar a posição dos espectadores - fazendo dos haitianos um público em primeira instância e dos locais, os estrangeiros - para depois somar-se como corpo único, assimilado, cosmopolita.
Ainda como outros enlaces da intervenção em neon Plas Ayiti, havia a intersecção com o filme-instalação Plas Ayiti, produzido pelos artistas Felipe Prando, Carlos Kenj e Daniel Yencken, em colaboração com os haitianos recém-imigrados David Limose, Serge Norestin e Team Fresh; havia uma reprodução da fotografia da instalação Plas Ayiti no Museu da Gravura do Solar do Barão, localizado a poucas quadras da Praça Tiradentes, que apontava para o deslocamento da experiência do museu para o espaço da cidade e ainda havia a distribuição para o público haitiano de cartões-postais, de 13 por 18 centímetros, com a imagem da instalação na praça, contendo inclusive as logos oficiais da cidade, num jogo que visava retornar para o Haiti, via postal, a incorporação desta presença antes imigrante agora situada, uma imagem-crítica transcultural tornada um novo real.
- Deutsche, Rosalyn. A arte de ser testemunha na esfera pública dos tempos de guerra. Concinnitas 15, ano 10, volume 2, Rio de Janeiro, 2009. Em tradução de Jorge Menna Barreto.
Milla Jung (1974) é artista e pesquisadora em Artes Visuais. Tem doutorado em Poéticas Visuais (USP), mestrado em Teoria da Arte (UDESC), especialização em fotografia (UCAM) e aperfeiçoamento em fotografia documental (ICP/NY e Escola para Assuntos Fotográficos de Praga). Atualmente investiga questões sobre imagem e esfera pública a partir da relação entre práticas artísticas e espaços sociais.